Uma queda da escada de alumínio, um
corte na mão ao abrir uma lata de conserva, arranhões no rosto da criança
provocados por objetos pontiagudos no carrinho de bebê. Muita gente não sabe,
mas esses são exemplos de acidentes de consumo. Esse tipo de acidente ocorre
quando um produto ou serviço prejudica a saúde ou a segurança do consumidor,
mesmo quando utilizado de forma adequada ou de acordo com as instruções
apresentadas pelo fornecedor.
As vítimas não costumam reclamar nos
serviços de atendimento das empresas. E quando necessitam de atendimento médico,
os hospitais, em geral, também não registram a ocorrência como um acidente. O
Instituto Nacional de Metrologia (Inmetro) está buscando parcerias entre os
profissionais de saúde para incentivá-los a registrarem os casos. Isso
aumentaria as estatísticas a respeito do assunto, tornando possível a adoção de
políticas públicas para o setor.
— Para podermos avaliar a situação de
cada produto, é preciso que o número de registros de acidentes aumente. É uma
contradição, pois, obviamente, ninguém deseja esse tipo de ocorrência. Mas, o
fato é que, com um número maior de dados, podemos sugerir políticas públicas,
indicar aos fabricantes que mudanças podem ser feitas nos produtos e até passar
a exigir que só sejam vendidos com o selo de qualidade — explica André Santos,
chefe da Divisão de Orientação e Incentivo à Qualidade do Inmetro.
Programa de avaliação de produtos
O dano pode ser causado por um
defeito no produto, pela falta de informação sobre o uso adequado ou o perigo
que ele representa. E também quando existem informações incorretas em relação ao
seu uso.
Com o objetivo de reduzir o número de acidentes de consumo,
tomando providências com base nos relatos registrados em seu banco de dados, o
Inmetro tem realizado um programa de avaliação de produtos com a participação da
Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), da rede de hospitais
Sentinela, em Brasília, do Sistema Nacional de Consumo (Sindec) e da Secretaria
Nacional de Defesa do Consumidor (Senacon).
— Estamos negociando com os
Ipems (Institutos de Pesos e Medidas) um acordo de cooperação para ampliar as
informações deixadas no banco de dados de acidentes de consumo — afirma Santos,
do Inmetro.
De acordo com números do banco de dados do Inmetro, os
produtos infantis (14%) são os principais responsáveis pela ocorrência desses
tipos de acidente. Em seguida, vêm os eletrodomésticos e similares (10%). Os
alimentos (9%) ficam em terceiro lugar quando se trata de provocar acidentes de
consumo, como intoxicações.
Quando o acidente ocorre por defeito de
fabricação, manutenção ou ausência de informação, surge a responsabilidade
civil. O fornecedor tem a obrigação de indenizar. Por outro lado, quando
acontece por falta de cuidado por parte do consumidor, considera-se excluída a
responsabilidade civil ou mesmo penal por parte do fabricante.
Proteção
à saúde é direito básico
Segundo o advogado Antonio Mallet, quando for
vítima de um acidente ao utilizar um produto ou serviço, o consumidor deve
buscar atendimento na rede hospitalar, “que tem a obrigação legal de fornecer,
ante a solicitação do paciente ou de seu responsável”, a cópia do boletim de
atendimento médico, ou prontuário, quando for o caso. É importante também
registrar a ocorrência na delegacia policial mais próxima do local do acidente.
— Em casos de lesões físicas, a vítima poderá ingressar com uma ação
judicial em face do fornecedor, requerendo uma reparação pelo dano suportado. A
responsabilidade do fornecedor é de caráter objetivo. Isso significa dizer que
não caberá, nessas situações, discutir culpa, basta que fique demonstrado que,
ao utilizar determinado produto ou serviço, o consumidor sofreu um dano, que não
foi causado por sua culpa exclusiva — afirma Mallet, que também é presidente da
Associação de Proteção e Assistência aos Direitos da Cidadania e do Consumidor
(Apadic).
O Código de Defesa do Consumidor (CDC) estabelece, no artigo
6º, “que é direito básico do consumidor a proteção à vida, à saúde e à segurança
contra riscos provocados por práticas no fornecimento de produtos e serviços”. O
tema também é tratado nos artigos 14º a 16º como fato do produto ou serviço.
— O conceito de acidente de consumo deve ser analisado de forma ampla,
pois estamos inseridos em uma sociedade de consumo em massa, e, no caso do
Brasil, com o crescimento acelerado de nossa economia, temos uma nova camada
social, que tem acesso a mais bens e serviços, o que acarreta uma maior
possibilidade de acidentes ocorrerem — ressalta Mallet.
Entre os
diversos casos atendidos pela associação estão o de uma consumidora que, em
2001, quando era menor de idade, sofreu um grave acidente em um parque aquático
ao utilizar um dos brinquedos. O parque foi condenado a indenizar a vítima por
dano moral, estético e material, pois ficou provada falha na prestação do
serviço.
Segundo o Inmetro, nem sempre os produtos e serviços colocados
no mercado de consumo oferecem a segurança deles esperada. Assim, quedas
provocadas por um piso escorregadio, choques ocasionados por produtos elétricos,
cortes devido à abertura de embalagens, ingestão de alimentos contaminados,
cortes ou lesões provocados por produtos infantis com rebarbas são, dentre
outros, alguns dos exemplos de acidentes de consumo.
— Outro exemplo foi
o caso ocorrido com duas consumidoras que compraram em um supermercado um bolo
de aniversário, fabricado pelo próprio estabelecimento. Depois que serviram aos
convidados, perceberam que ele estava estragado. Elas precisaram de atendimento
hospitalar. O supermercado foi condenado a indenizar cada uma em R$ 5 mil, por
ter comercializado produto impróprio para consumo, que causou dano físico, além
de constrangimento — diz Mallet.
‘Não se deixe levar pelo menor preço’
O presidente da Apadic lembra que o consumidor deve estar sempre atento,
seja na hora de comprar um produto ou contratar um serviço. Ao adquirir um
produto, o consumidor deve buscar as informações básicas quanto a sua utilização
e para qual fim se destina, procurando sempre verificar, quando for o caso, se a
mercadoria tem certificação pelos órgãos responsáveis.
— E nunca se
deixar levar pelo menor preço — destaca o advogado.
Luiza Xavier
- O GLOBO - ECONOMIA
Fonte: Clipping AASP